Viva a Tecnodiversidade!
Marabá teve a honra de receber a XI edição do Simpósio Internacional de Inovação em Mídias Interativas (SIIMI) nos dias 13 a 15 de Agosto de 2024, um dos dois grandes eventos organizados pelo Media Lab/BR. O tema não poderia ter mais correlação com o lugar do evento e com o momento que vivemos. Nosso mundo está passando por mudanças gigantescas causadas principalmente por nós enquanto sociedade consumidora. São diversas as mudanças climáticas, as crises hídricas e tempestades fora de época, fenômenos que irão acontecer mais frequentemente, em escalas provavelmente muito mais catastróficas. E a relação que o conceito Tecnodiversidade, apresentado para nós pelo teórico Yuki Hui, estabelece com a elaboração de um futuro promissor é entender que as tecnologias não devem ser uma ferramenta de colonização, elas são adaptadas às necessidades, técnicas, saberes locais.
No caso da Amazônia, queremos garantir que se entenda os conhecimentos ancestrais e os saberes tradicionais, ligados à observação da natureza, como saberes com uma tecnologia muito mais avançada que muitas que tem sido desenvolvidas hoje e que não devem ser rotuladas de maneira depreciativa por serem mais antigas. Infelizmente fomos ao longo de séculos treinados a perceber valores para objetos e coisas mais novas, recém construídas ou montadas. Esse comportamento consumista movimentou o crescimento dos seres humanos, levou à descobertas importantes, mas também levou à guerras, destruição da natureza e o desperdício.
Ao negar o antigo como obsoleto apenas por sua idade, nos rebelamos ao movimento de colonização que agora se observa trazido pela importação de tecnologias imbuídas de práticas e métodos “corretos” de serem utilizadas, isso causa uma massificação, uma perda enorme das visualidades de povos e culturas que observam o mundo sob outras óticas, outras cosmovisões. Essa edição do evento foi elaborada com esse intuito, trazer os pesquisadores e pesquisadoras do mundo para a cidade de Marabá no Pará, em uma universidade relativamente nova com apenas onze anos de existência e que tenta promover esse tipo de visão em uma região conhecida pelo conflito entre os grandes donos de terra e as comunidades indígenas e os movimentos sem terra. Quisemos com isso que esses grandes nomes pudessem ser impactados pelas cores, brilhos, músicas, danças, culinária que são marcadas lindamente por esses conhecimentos ancestrais e tradicionais.
Por isso que acreditamos que a resposta para nossa sobrevivência à essas consequências do uso desarmonioso que os seres humanos fizeram da Natureza, e principalmente, para deixarmos a Terra se curar, está nesse retorno à nossa ancestralidade. Então, desde o início quisemos que os representantes dessas cosmovisões tivessem o papel principal no evento. Foi por essa razão que convidamos para a mesa de abertura o Prof. Dr. Gersem Baniwa, um pesquisador que por ser indígena, mas ter vivido no meio acadêmico nos moldes ocidentais pôde nos abrilhantar com suas experiências em harmonizar essas duas cosmovisões. Seguido a isso tivemos uma mesa extremamente impactante com a representação Quilombola do aluno Deleon Soares e da representação indígena com o aluno de Artes Visuais Kokinire Haraxare Gavião que falaram novamente sobre suas experiências nessa resistência contra uma colonização das subjetividades.
Assim tivemos a intenção de deixar esse espaço livre para ouvirmos àqueles e àquelas que representam essa ancestralidade, mas pela quantidade de representantes que estiveram nos três dias do evento, cremos que ainda não conseguimos provar para estes e estas que nosso interesse é sincero, que não tentamos explorar, que somos bem diferentes de nossos antepassados que viam em nossos irmãos e irmãs de outras cores de pele outra coisa que não um SER HUMANO. Porém, agradecemos aos representantes que estiveram conosco e esperamos que levem as mensagens aqui apresentadas para suas aldeias, suas vilas, seus quilombos, seus bairros, suas casas para que saibam que a Universidade não tem o intuito de ser um lugar fechado em orgulho e detentora do "conhecimento humano¨, mas um espaço aberto à sociedade, para debate e inclusão.
Esse será o desafio para os próximos anos e temos a esperança que esse evento tenha sido um desses momentos em que a esperança brilhou lindamente. Arte é um saber humano que, no Brasil principalmente, sofre com preconceito e tem sua importância diminuída. O Brasil é um país do "funcionalismo", ou seja, tudo tem que ter função imediata e clara, como resultado pesquisas puramente teóricas e investigações estéticas são comumente relevadas à última categoria de necessidades. Estranho pensar que o afastamento, por exemplo, da função do artista da prática do engenheiro foi uma construção da Era Moderna: Leonardo Da Vinci era um grande artista, mas um excelente engenheiro, arquiteto, urbanista; além dele eu poderia citar diversos que em seus exercícios diários produzem cálculos, misturas químicas, realizam processos de investigação meticulosamente organizados e delineados, ou seja, todas as práticas comuns à investigação científica. Concluímos que só existem benefícios na aproximação do pensamento científico e da prática artística.
Veremos que para os pesquisadores da tecnologia (Filosofia da Tecnologia, Sociologia da Tecnologia, entre outras denominações), não existe verdadeira INOVAÇÃO sem o pensamento CRIATIVO. E criatividade com certeza encontrara nesses trabalhos que foram apresentados no evento. Nós do Media Lab/BR temos que agradecer àqueles e àquelas que estão conosco nessa mudança de paradigma: Fundação Itaú, Fibralink, a Associação das Modalidades Esportivas e Direitos Sociais - AMESP, nossos diversos parceiros, técnicos e professores da Unifesspa que ajudaram que esse evento acontecesse, nosso muito obrigado. Esperamos que esses três dias de atividades com presenças ilustres, projetos e obras que visam apresentar esse futuro bem vindo que para nós sempre vai ser um AMAZONOFUTURO.
Prof. Dr. Teófilo Augusto
Presidente da Comissão de Organização